domingo, 16 de agosto de 2015

AS PAUSAS TAMBÉM SÃO NECESSÁRIAS


AS PAUSAS TAMBÉM SÃO NECESSÁRIAS

Quando o que não gostamos termina,
nos sentimos agradecidos e aliviados.
Mas, quando o que amamos sinaliza
que nem tudo é fluxo, e que as pausas
também são necessárias;
a água evapora no momento em que
estamos nadando, e o vento deixa  de soprar
no momento em que estamos voando.

Braços que não encontram água
para continuar nadando...
Asas que perderam a sustentação do vento
e se sentem forçadas a interromper o voo...

Caminhar é preciso,
mas os passos são lentos...
Imaginamos um percurso,
mas a estrada à nossa frente
nos conduzirá a outro lugar...
Melhor ou pior, só saberemos
depois que tivermos chegado...

E, assim é a vida:
Nem tudo é fluxo;
as pausas também
são necessárias.



TANGERINO E A CARTOMANTE


Aquela já era a quinta vez que Tangerino caminhava de uma esquina à outra. Ele ia e voltava, ia e voltava!... E não se encorajava a entrar no prédio onde a Cartomante morava.

Ele gostava de compor e tocar violão nas horas vagas. No início, isso era apenas uma distração. Mas, com o passar do tempo, acabou se tornando algo necessário... Ele só se sentia bem se estivesse casando as notas do violão com as palavras da canção.

Quando ele estava percorrendo pela sexta vez o mesmo trajeto, ele parou na metade e entrou no prédio. A Cartomante o recebeu na sala de jantar do seu apartamento. Tangerino reparou que a decoração era estranha, mas ele preferiu não prestar atenção aos detalhes e ir direto ao assunto que o preocupava.

Ele tencionava despejar o motivo que o conduzira até ali, mas calou-se no momento em que a Cartomante disse: “Espere, não diga nada, porque não é preciso. Está vendo essa cadeira aí, ao seu lado?... Existe um jovem sentado nela. Embora você não consiga vê-lo, ele está aí, e é ele quem o influencia a estar sempre de posse do violão. Quando ele ainda era vivo, ele tocava e cantava durante horas, mas um acidente abreviou a estadia dele neste plano. Como você também é apaixonado por Música, ele permanece ao seu lado, porque deseja ter a oportunidade de inspirá-lo.”.

Contemplando o ar de descrença no rosto de Tangerino, a Cartomante acrescentou: “Você pode não acreditar, mas eu também não estou sozinha. Está vendo esta cadeira aqui do meu lado?... Existe uma mulher sentada nela. Eu possuo vários dons, mas não foi o dom da adivinhação que me falou sobre o rapaz que o acompanha, e sim esta mulher ao meu lado. Em vida, ela gostava de ajudar as pessoas... E é isso o que ela continua fazendo. Você ainda não acredita?!... Tudo bem!... Não precisa acreditar. Saiba apenas que, enquanto a paixão de vocês dois pela Música estiver em sintonia, vocês estarão se beneficiando mutuamente. Agora vá.”.

Tangerino só conseguiu encontrar palavras para perguntar: “Quanto lhe devo?”. A Cartomante respondeu: “Nada, absolutamente nada. Sou eu a devedora, porque você me deu a oportunidade de exercitar o dom que tenho de ver e ouvir as pessoas que se tornaram invisíveis e inaudíveis nesta dimensão.”.

Tangerino agradeceu e já estava se retirando quando a Cartomante lhe disse: “Você também tem um dom muito precioso.”. Apenas para evitar ser indelicado, ele perguntou: “E que dom é esse?...”. E a Cartomante respondeu: “Você confia na intuição e consegue perceber e juntar as peças dos quebra-cabeças que a inspiração constantemente lhe fornece. Virar as costas para essa habilidade afastará certamente o jovem que o acompanha. Mas, ao mesmo tempo, também afastará você de si mesmo. Não questione o dom que Deus lhe deu. Aprimore-o e fortaleça-o, para que ele possa revelar o universo que existe em seu interior.”.



sexta-feira, 14 de agosto de 2015

A AMBIÇÃO, A MENTIRA E A SAUDADE DO REI


Era uma vez um rei muito ambicioso, que não mediria esforços para que o seu reino prosperasse rapidamente. Ele chegou mesmo a prometer a uma feiticeira que se casaria com ela, se ela tivesse o poder de garantir a prosperidade de seu reino.

A feiticeira amava o rei e cumpriu sua parte no acordo. Mas ela se decepcionou terrivelmente, quando ele confessou na véspera do casamento: “Eu não amo você. Menti que me casaria, porque desejava que o meu reino florescesse. Eu pretendo me casar com a princesa do reino vizinho, para poder ampliar o meu reino.”.

A feiticeira, com o seu manto azul recoberto de estrelas, pareceu mais alta do que era porque esticou o corpo e levantou os braços enquanto dizia: “Você mentiu para mim durante três meses, e o seu filho viverá na escuridão durante trinta anos, porque os olhos dele não suportarão a luz do sol.”. No mesmo instante, ela desapareceu.

No dia seguinte, o rei casou-se com a princesa que garantiria a expansão de seus domínios e de suas riquezas. Após um ano, o primeiro e único filho que o casal teria nasceu.

Eram poucas as pessoas que conheciam o garoto, porque ele frequentava apenas os cômodos que possuíam grossas cortinas cobrindo as janelas.

A ambição do rei cedeu lugar à tristeza e ao arrependimento. Ele não demorou a descobrir que também não amava a sua esposa. E, com o passar do tempo, a saudade começou a pressionar o seu coração. Ele repetia a si mesmo: “Saudade!... Eu deveria odiá-la pelo mal que ela causou ao meu filho e, no entanto, eu sinto saudade!... Como posso sentir saudade se não a amo?!... Se eu não a amasse, não sentiria saudade!... Será que a amo?!... Não!... Não pode ser!...”.

E o inesperado aconteceu... A rainha, que antes brilhava em festas e bailes deslumbrantes, não conseguia se habituar a viver naquele palácio sombrio. Entristecida, ela costumava pensar: “Não é porque o meu filho não suporta a luz que eu sou obrigada a reduzir o meu esplendor!... Eu quero ser feliz!... E, para isso, tenho que voltar a ser livre!... Preciso partir!...”. E, certo dia, a rainha comunicou ao rei que o casamento estava desfeito; ela deixaria o filho aos cuidados dele e voltaria a morar em seu antigo castelo. Embora surpreso com a decisão da rainha, o rei não se animou a colocar objeções... Ele também ansiava pela liberdade porque sentia saudade da feiticeira.

Quando sua ex-esposa partiu, o rei foi procurar a feiticeira para dizer: “Você poderá pensar que estou aqui apenas por causa do meu filho, mas isso não é verdade. Descobri que amo você e peço que me perdoe.”.

Bebendo da sinceridade que parecia haver nos olhos do rei, a feiticeira disse: “Se o que você diz é verdade, o seu filho neste exato momento já está curado. Por outro lado, se o que você diz é mentira, você não tornará a vê-lo porque eu o colocarei sob minha proteção.”.

Esticando o corpo e levantando os braços, a feiticeira pronunciou as palavras: “Ventos, ventos, formem um redemoinho e me tragam o filho do rei se ele estiver mentindo. Agasalhem-no, cubram-no, protejam-no dos olhos deste pai mentiroso!...”.

A feiticeira esperou, esperou, e nada aconteceu... Os ventos permaneceram calmos, e o coração dela também serenou. Com a voz encharcada de paixão, ela perguntou: “Quando você descobriu que me amava?!...”.

O rei, retribuindo a ternura que havia nos olhos da feiticeira, disse: “Eu sempre a amei, mas talvez não quisesse admitir... Foi a saudade que fez com que eu compreendesse que nada tem sentido quando estou longe de você.”. A feiticeira sorriu, e o rei a beijou.

Quando o beijo terminou, o rei ficou surpreso ao verificar que estavam no jardim do palácio. E ele ficou radiante quando ouviu o filho chamando por ele e o viu correndo em sua direção sob a luz do sol.



terça-feira, 11 de agosto de 2015

A CURIOSIDADE E A PRUDÊNCIA DE ALEXANDRE


Alexandre adorava caminhar na praia à noite. Depois, ele sentava e contemplava o mar. Várias vezes, ele adormeceu deitado na areia, sob a luz das estrelas. Em uma dessas ocasiões, ele despertou bruscamente porque se assustou com o barulho ensurdecedor que vinha do mar... As ondas estavam agitadas, e algo, que ele não conseguiu distinguir o que era, foi arremessado em sua direção... Ele se afastou para evitar ser atingido. A partir desse momento, o barulho cessou, e o mar voltou a se acalmar.

Curioso, Alexandre se aproximou do objeto: era um baú amarrado com correntes. Ele pensou que algo muito precioso ou perigoso deveria ter sido trancado dentro daquela caixa de madeira.

Ele levou o baú para a garagem de sua casa e, com o auxílio de um alicate e de uma serra elétrica, conseguiu livrá-lo das correntes. Quando ele abriu o baú, uma fumaça escura, com um cheiro horrível, foi liberada antes que ele conseguisse ver o que havia em seu interior: era uma ânfora e estava lacrada.

Após alguns minutos de hesitação, Alexandre retirou o lacre e teve que se afastar novamente porque havia mais fumaça com aquele odor insuportável no interior da ânfora.

Contrariado, Alexandre exclamou: “É só isso: fumaça?!...”. E o seu coração quase saiu pela boca, quando uma voz, que parecia vir de dentro da ânfora, perguntou: “E o que você esperava?... Responda!... O que você disser que esperava ver será o que você verá em seguida.”.

Alexandre, embora fosse curioso, era prudente. Ele pensou, pensou... E imaginou que, se dissesse “um gênio”, provavelmente a ânfora libertaria um gênio mau. Após refletir muito, ele respondeu: “Bondade.”.

No mesmo instante em que ele disse essa palavra, houve um estrondo, e o baú desapareceu, deixando, em seu lugar, uma corrente que possuía a metade de um coração como pingente.

Uma voz ecoou no teto da garagem: “Você foi sábio... Desejando a bondade, você evitou que a magia armazenada na ânfora fosse reativada. Essa magia pertencia a um gênio mau. Eu consegui aprisioná-la. A sua curiosidade a libertou parcialmente. Se você também tivesse dado ouvidos à ambição, a magia teria despertado o gênio de seu sono profundo. Você, no entanto, desejou que a bondade se manifestasse!... Quem é capaz de desejar algo tão sublime, não pode viver sem amor. Quando você encontrar uma jovem usando um pingente com a outra metade do coração, não tenha medo de se apaixonar, porque é ela a sua alma gêmea. Seja feliz, Alexandre!...”.






segunda-feira, 10 de agosto de 2015

O DESENHO DE AURÉLIO E A HISTÓRIA DE LILIANA


Por que Liliana gostava tanto de escrever?... Talvez fosse pelo mesmo motivo que Aurélio gostava de desenhar!...

Não!... Liliana escrevia porque a sua natureza sentia necessidade de mergulhar no mundo de sonhos que sua imaginação criava. Mas Aurélio não costumava entregar-se ao devaneio. Ele gostava de observar o mundo ao seu redor e sentia prazer em descobrir o que a sua mão conseguia criar. Não!... Criar talvez não fosse a palavra exata. Representar expressava melhor o que o dom de Aurélio permitia que ele fizesse.

Certo dia, Aurélio e Liliana se encontraram em uma biblioteca. Liliana parou de escrever no momento em que ouviu Aurélio perguntar: “O que você está fazendo?... Uma redação para a escola?”. Liliana respondeu: “Não. Estou escrevendo uma história. O que você está desenhando?!... É um despertador?!... Por que você está desenhando um despertador?!...”.

Aurélio exclamou: “Odeio acordar cedo!... Como não posso destruir o meu despertador porque a minha mãe ficaria furiosa, resolvi desenhar um para detoná-lo.”.

Liliana disse: “Eu não compreendo... Você seria capaz de destruir o seu desenho?!... Em vez de acender o pavio da dinamite, você poderia livrar o despertador dessa ameaça e permitir que eu escrevesse uma história para ele.”.

Aurélio perguntou: “Está falando sério?!... Você está querendo salvar o despertador da destruição para colocá-lo em uma história?!... Ele já está inserido em um contexto trágico: será destruído para não ter a oportunidade de acordar mais ninguém.”.

Liliana levantou-se. Preferia ir embora a iniciar uma discussão sem propósito. Aurélio perguntou: “Aonde vai?... Eu pensei que estivéssemos conversando!... Não me diga que ficou zangada!... Ainda bem que você não viu o que eu faço com os bonecos que desenho!... O último eu cortei ao meio com a borracha. Sente-se, por favor. É como eu disse: são só desenhos!... Você não vai me deixar aqui, falando sozinho, apenas porque eu me divirto destruindo os meus próprios desenhos!...”.

Liliana sentou-se e olhou nos olhos de Aurélio enquanto dizia: “Eu adoro escrever, mas não sei desenhar. As pessoas não são atraídas pelo texto e sim pela imagem... Se eu soubesse desenhar, eu jamais destruiria os meus desenhos. Eu os protegeria e criaria histórias para eles. Esse seu despertador, por exemplo, ele poderia pertencer a um mago que desejava controlar o tempo... Ele poderia apressar os acontecimentos... Bastaria que ele programasse o despertador para que a magia fosse realizada no momento desejado... O toque do despertador substituiria as palavras mágicas...”.

Aurélio não conseguiu segurar o riso quando exclamou: “Você é maluca!... De onde tirou essa ideia que não tem nada a ver com o meu despertador?!... Ele terá um fim mais glorioso sendo destruído do que pertencendo a esse mago que a sua imaginação criou. Por que está chorando?!... Eu não tive a intenção de ofendê-la... Eu só disse o que penso!...”.

Com a voz mesclada de mágoa, Liliana perguntou: “Se eu valorizo o seu desenho, por que você zomba da minha história?!... Por mim, você pode guardar esse seu despertador, explodi-lo, refazê-lo e tornar a destruí-lo quantas vezes tiver vontade!...”.

Olhando nos olhos de Liliana, Aurélio disse: “Eu tenho uma ideia melhor: Apagarei a corda e a dinamite, enfeitarei o despertador e desenharei o mago, que desejava controlar o tempo, ao lado dele. Está feliz agora?...”.

Sorrindo, Liliana respondeu: “Sim. Obrigada!... Você ainda não me disse o seu nome... Eu me chamo Liliana.”. Aurélio retribuiu o sorriso quando disse: “O meu nome é Aurélio. Se você vier aqui amanhã, eu lhe entrego o desenho.”.

Aurélio e Liliana se encontraram no dia seguinte. Ela sorriu ao ver o desenho, e ele leu a história que ela havia escrito. Embora Aurélio ainda pensasse que a história não tinha nada a ver com o despertador que ele desenhara, para evitar aborrecer Liliana, ele preferiu se calar a esse respeito. E aquele foi o início de uma duradoura amizade.




domingo, 9 de agosto de 2015

OS DESENHOS DO MAGO SEVERINO

O mago Severino parecia ter nascido com um dom celeste. Ele não possuía uma varinha e não costumava pronunciar palavras mágicas. Ele era um Artista, e a magia era obtida através de sua habilidade de desenhar tudo aquilo que ele desejasse trazer para esta realidade.

Sim, as criações de Severino se materializavam a partir do momento em que ele acreditava que estivessem prontas. Ele se tornou rico e poderoso. Mas, o que ele mais desejava, seus desenhos não poderiam lhe trazer: amor. Ele poderia dar vida aos animais e às plantas que desenhasse, mas os seres humanos que ele criava permaneciam imóveis no papel.

Para ter amor, ele precisaria se relacionar com as pessoas, e isso ele não conseguiria fazer porque, para agradar-lhes e satisfazer suas ambições, ele teria que passar dias e noites desenhando tudo o que elas lhe pedissem.

Severino criara para si mesmo um mundo que era só seu. Ele vivia cercado pela natureza e, dentro de seu castelo, ele era um rei. Mas Severino não tinha o dom de desenhar sentimentos, e os seus relacionamentos não chegaram a florescer.




sexta-feira, 7 de agosto de 2015

VERÁSIO E O DESAPARECIMENTO DE OLAVO

Os guardas da prisão entreolharam-se antes de um deles comentar: “Ele não é normal. Outro, no lugar dele, não teria presença de espírito para continuar agindo como se nada estivesse acontecendo. Ele pede sempre mais cadernos e canetas!... O que será que ele tanto escreve?!...”.

O outro guarda respondeu: “Histórias. Você tem razão: ele não é normal. Eu ouvi dizer que, antes mesmo de ser preso, ele já vivia isolado naquela cabana e passava horas e horas escrevendo coisas que apenas ele teria vontade de ler. Essas histórias devem ter mexido com a cabeça dele porque  ele insiste em dizer que não teve nada a ver com o desaparecimento do menino. Ele chegou mesmo a afirmar que foi o mago, conselheiro do rei, quem o raptou porque o rei precisava de um herdeiro.”.

E essa era a mais pura verdade. Verásio estava em sua cabana escrevendo quando um menino bateu à porta gritando por socorro. Antes de abrir a porta, Verásio olhou pela janela e viu o garoto lutando para libertar o braço da mão forte que o segurava. E o mago, vestido com seu manto negro, dizia: “Acalme-se, Alteza... Se não se acalmar, acabará se machucando. Beba este líquido, e logo estaremos na dimensão onde os sonhos se realizam.”.

O mago obrigou o menino a beber o líquido viscoso, e os dois desapareceram sem deixar vestígios. Verásio foi preso e não conseguiu provar que nada teve a ver com o desaparecimento do garoto. Ele sempre gostou de escrever, mas agora era por esse motivo que ele escrevia alucinadamente. Ele precisava se conectar àquela dimensão para conseguir trazer o menino de volta.

E finalmente Verásio conseguiu!... Em sua imaginação, ele ouvia o garotinho insistindo que não desejava afastar-se de sua realidade, porque amava Maria e jurara que, quando ele crescesse, se casaria com ela. O amor opera milagres!... Nada do que Olavo dissera antes convenceu o mago e o rei a libertá-lo, mas o amor que ele sentia por Maria era um sentimento puro e raro que precisava ser preservado.

O coração de Verásio tranquilizou-se porque ele guardava a certeza de que Olavo retornaria. 

Na manhã seguinte, o garoto reapareceu, e Verásio foi libertado. Os pais de Olavo só consentiram que Verásio conversasse com ele uma semana depois. Verásio sentiu o abraço gelado da decepção quando verificou que a lembrança de ter estado naquela dimensão em que ele poderia ter se tornado rei tinha desaparecido da  mente de Olavo sem deixar vestígios.



segunda-feira, 3 de agosto de 2015

UM FINAL DE SEMANA INESQUECÍVEL


Aquele parecia um ótimo lugar para passar o final de semana!... Era um lugar paradisíaco: as casas ficavam ilhadas, e os barcos eram o único meio de transporte. Eu adoro pescar!... Imagine só como fiquei empolgado pensando naquele final de semana que passaria sozinho naquela casa enorme, rústica e aconchegante!...

O dia finalmente chegou, e lá estava eu fazendo planos e mais planos: o contato com a natureza estava garantido e era um convite ao relaxamento e ao descanso há tanto tempo adiados!... Tempo!... Eu cheguei a desejar que o tempo congelasse para que eu não precisasse nunca mais sair de lá e reassumir as obrigações.

Como estava perto do horário do almoço, resolvi preparar uma refeição antes de confiar o meu relaxamento à minha vara de pescar. Eu estava na cozinha quando  comecei a ouvir sons estranhos e risadas na pequena faixa de terra que circundava a casa. Larguei tudo e saí para verificar quem estava invadindo o meu santuário e quase desmaiei no momento em que vi três sereias ordenando aos golfinhos, peixes e cavalos-marinhos que permanecessem na água.

Eu nem tive tempo de me perguntar se aquilo era um sonho ou um pesadelo porque logo uma das sereias aproximou-se de mim e disse: “Ouça muito bem o que vou lhe dizer porque nós, sereias, não temos o hábito de repetir advertências: este lugar era nosso antes de vocês, humanos, chegarem construindo suas casas, poluindo nossas águas e matando nossos amiguinhos. E eu posso lhe garantir que este lugar continua sendo nosso. Se quer descansar, descanse, mas mantenha-se longe da água.”

O olhar da sereia, apesar de belo, era ameaçador. Eu não me animei a emitir nenhum comentário... Voltei para dentro da casa, terminei de preparar a refeição e almocei, repassando na minha mente a cena que presenciara e as palavras que ouvira.

Eu passei o final de semana inteirinho longe da água. Não fiz nada do que planejara, exceto descansar. Dormi profundamente e, em sonho, era convidado a participar da festa e da alegria daqueles seres marinhos.

Eu só subi no barco quando chegou o momento de partir... E ainda me lembro do olhar terno e agradecido da sereia quando acenou para mim à distância. As pessoas não acreditam quando conto esta história, mas deveriam acreditar e, principalmente, deveriam manter distância daquele lugar. Eu fico imaginando o que teria acontecido se eu tivesse ignorado a advertência da sereia.   


Sisi Marques & Colaboradores: Cida Barreto, Eugenia D'Amorim, Rosangela Vanzilotta, Sonia Maria Camargo e Gilberto Gimarães Marques.