sexta-feira, 27 de março de 2015

O MAGO E O RELUZENTE GATO NEGRO

O castelo, construído pelo jovem mago há mais de dois séculos, provocava arrepios mesmo quando a neblina envolvia a montanha sombria e o tornava invisível.

Se aquela construção imponente atemorizava os habitantes da vila, imagine só o pavor que aquele semblante frio e impenetrável, no qual o tempo não conseguira deixar suas marcas, provocava.

O nome do mago ninguém ousava pronunciar. Apenas o reluzente gato negro sabia qual era o único arrependimento que ele guardava, porque o mago lhe dizia todas as manhãs: “Acorde, gato preguiçoso!... A astúcia daquela serpente uniu o meu destino ao seu!... Quando eu fui visitá-la para exigir que se casasse comigo, ela afirmou que só se casaria com você. Eu reuni todos os meus poderes para transformá-lo nesse gato. Se ela desejasse vê-lo novamente, ela teria que se unir a mim. Após a realização do feitiço, eu tive que me recolher para recuperar a quantidade enorme de energia que eu havia gasto inutilmente.”

Após colocar o leite na vasilha do gato, o mago acrescentava: “Aquela viborazinha mentiu que estava apaixonada por você e esperava mesmo que eu o enfeitiçasse, porque desejava se livrar da sua insistência. Posteriormente, as minhas investigações revelaram que você havia entregado ao pai dela muito dinheiro em troca do consentimento dele para se casar com ela.”

Quando o mago chegava nesta parte, já havia se sentado em sua poltrona, e deixava o chocolate quente esfriar enquanto dizia: “Mas o que mais me enfurece é saber que ela não arquitetou esse plano sórdido sozinha. O chacal que eu criei como se fosse meu próprio filho e a quem ensinei tudo o que eu sabia, incluindo a preparação do feitiço da imortalidade,  deve tê-la orientado. Não existe outra explicação!... Quando eu despertei do sono profundo de refazimento, ele havia desaparecido, e a garota também nunca mais foi vista. Os dois estavam apaixonados certamente!... E pensar que eu me dei ao trabalho de roubá-lo de sua mãe quando ele ainda era um bebê!... Esse é o único arrependimento que tenho!... Se eu tivesse conseguido prever que ele me trairia depois de tudo o que eu tencionava fazer por ele, eu jamais lhe teria dado o privilégio de assemelhar-se a mim. E o pior de tudo é que não consigo rastreá-los porque a magia dele atingiu um alto grau de excelência e não deixa vestígios!...”

A conversa do mago com o gato nunca se estendia além desse ponto. Embora os dois passassem o dia todo juntos, o mago guardava a sua revolta para si, e o gato também compreendia a inutilidade de expressar sua desventura em miados.  




quinta-feira, 26 de março de 2015

O POTE VAZIO (HISTÓRIA CONTADA POR MAYRA BARROS)


Facebook - Cantinho da Leitura de Caetano Augusto Petrarca dos Anjos

Rui: Qual é a sugestão de leitura para hoje?...
Caetano: Em vez de ler, hoje eu gostaria de ouvir alguém contando uma história.
Rui: Vamos assistir ao vídeo da Mayra Barros?!... A Sisi também adorou aquela história que fala sobre as sementes que o Imperador entregou aos garotos para que eles plantassem e retornassem depois de um ano.
Caetano: Rui, você é um péssimo contador de histórias e acabará estragando tudo!... Vamos ouvir quem tem o dom de nos encantar e nos atrair para o mundo mágico das histórias!...
Rui: Concordo. Eu já estou pronto para assistir ao vídeo!... 



domingo, 22 de março de 2015

O LUGAR ONDE NASCEM OS SONHOS

Se eu pudesse, eu iria até o lugar onde nascem os sonhos para descobrir seus segredos. Eu não estou falando dos sonhos que a paixão deposita em nosso coração. Estou pensando nas situações imaginárias que vivemos enquanto dormimos. Para ser mais exata, foi um único sonho que me trouxe esta reflexão.

Já faz algum tempo, eu sonhei com um caldeirão de água fervente. Dentro dele, havia algo como um pedaço bem pequeno de macarrão talharim dobrado ao meio.  O pedaço de macarrão parecia já estar se desfazendo, e eu o retirei de dentro do caldeirão com uma concha, para colocá-lo em um prato e acrescentar água fria sobre ele. Foi nesse momento que o estranho milagre começou a acontecer.

Uma delicada fadinha aproximou-se da borda do prato, e eu pude verificar que, no lugar daquilo que parecia um pedacinho de macarrão dobrado, havia um cordãozinho comprido, todo retorcido. A fadinha retirou as asinhas das costas e colocou-as dentro do prato. Depois, ela mergulhou na água fresquinha e ficou observando o cordãozinho, como se ele fosse um ser que estivesse se desenvolvendo.

Ah, infelizmente, eu acordei!... Mas continuei pensando naquele sonho. Entre um cochilo e outro, a minha imaginação me conduziu a um bosque, onde havia um lago. Uma fada, que não era a fadinha do meu sonho, insistia para que eu despertasse todas as fadinhas que haviam sido reduzidas a pequeninos pedaços de fita dobrados, que se assemelhavam a macarrão talharim. A preocupação com as fadinhas entristecia o semblante da fada que parecia uma rainha. Ela teria conseguido me convencer a ajudá-la, se a minha intuição não tivesse sussurrado que o seu único objetivo era criar um exército de fadinhas.

Como eu gostaria de ter continuado pensando e cochilando, para saber mais sobre os planos da fada!... Mas as preocupações com esta realidade começaram a ecoar mais alto, e eu tive que me levantar. Você, alguma vez, já teve um sonho mais estranho do que esse?!... Se a resposta for sim, eu tenho a certeza de que, se você pudesse, também iria ao lugar onde nascem os sonhos para descobrir seus segredos.








segunda-feira, 16 de março de 2015

AS CRIANÇAS ALIENÍGENAS E OS MORADORES DA VILA

Há muitos e muitos anos, uma nave cruzou o céu e pousou em um terreno próximo a uma vila. As mulheres ficaram em casa para protegerem as crianças, e os homens reuniram todas as armas que tinham na esperança de vencerem os inimigos. Um deles exclamou: “Uma invasão alienígena!... Nunca imaginamos que isso pudesse acontecer!... Deveríamos estar mais preparados. Eles certamente rirão da precariedade de nossas armas. Se conseguirmos escapar desta...”

O homem teria continuado falando, se a porta da nave não tivesse deslizado para o lado revelando os passageiros que trouxera: crianças!... Desconfiados, os homens continuaram segurando suas armas como se estivessem prontos para enfrentar um exército. Mas as três crianças que desceram da nave continuaram sorrindo, e os seus olhos brilhavam de alegria!... Elas estavam realmente felizes, e os homens começaram a acreditar que, embora elas fossem estranhas, pareciam inofensivas.

Um dos habitantes da vila acolheu as crianças em sua casa, enquanto os outros se encarregaram de enterrar a nave para evitarem que mais crianças como aquelas, tão diferentes de seus filhos, fossem enviadas à Terra.

Eu gostaria de poder dizer que a alegria daquelas crianças contagiou os moradores da vila, mas não foi isso o que aconteceu. As crianças não conseguiram convencer aquelas pessoas a trocarem seus hábitos e suas certezas petrificantes pelo estado revigorante de felicidade que elas demonstraram que era possível alcançar.



domingo, 15 de março de 2015

SARA E O AMOR QUE DURARIA ETERNAMENTE


Sara era uma jovem muito bonita, que adorava passar os finais de semana na praia. Ela não tinha um namorado, porque não conseguia se interessar por ninguém. Para fugir da solidão, ela contava sempre com a companhia de sua cachorrinha. As duas eram mesmo inseparáveis!

Sara adorava observar o mar e ouvi-lo murmurar. O seu pensamento se distanciava e vagava sobre as ondas, fazendo com que ela se esquecesse dos dissabores e das preocupações. Ela permanecia indiferente aos olhares que a cercavam. E, além do mar, apenas a sua cachorrinha recebia a sua atenção.

Certo dia, porém, a serenidade de Sara turvou-se quando ela retornou de um de seus devaneios e não viu a sua cachorrinha querida ao seu lado. Ela se levantou e estendeu o olhar em todas as direções na esperança de avistá-la. Sara já havia começado a caminhar, mas deteve-se quando viu a cachorrinha correndo em sua direção. Ela não estava sozinha. Um cãozinho a acompanhava, e os dois pareciam estar se divertindo.

Quando eles se aproximaram, Sara disse: “Eu aqui preocupada, e você brincando com o seu novo amiguinho!...” Sara estava tão distraída que não percebeu que o dono do cãozinho os seguira. Para atrair sua atenção, que no momento estava voltada apenas para a sua cachorrinha, o rapaz começou a conversar com o seu cãozinho em voz alta.

Sara, que já havia se sentado na areia novamente, olhou para o lado e sentiu o coração bater mais forte no instante em que o amor lhe confidenciou que ali estava a sua alma gêmea. 



sexta-feira, 13 de março de 2015

OS SETE VENDEDORES E O MISTERIOSO FUNCIONÁRIO



Duas semanas antes da Páscoa, Felipe viajou para o litoral, confiante de que, em sua fábrica e em sua loja de doces, tudo aconteceria como ele havia planejado. Enquanto ele dirigia, ficava imaginando o acréscimo que a venda de ovos de Páscoa teria, devido à sua brilhante ideia de comprar fantasias de coelho para os vendedores da loja.

Naquela mesma manhã ensolarada, os sete vendedores da loja, suando dentro das fantasias que acharam ridículas e desconfortáveis, realizavam seu trabalho mecanicamente. A alegria estava ausente e teria continuado bem distante se, de repente, um sujeito baixinho, também fantasiado de coelho, não tivesse entrado dizendo: “Ânimo, rapazes!!!... Precisamos trazer para esta loja o espírito da Páscoa: renovação e alegria!!!...”

Um dos vendedores comentou em voz baixa: “Que figura!!!... O próprio coelho da Páscoa perderia para esse aí!!!... Somos sempre os últimos a saber o que ocorre nesta loja. Ele certamente está aqui para supervisionar o nosso trabalho. É melhor nos animarmos, se não quisermos perder o emprego.”

Felizmente o que parecia uma maré de azar tornou-se um mar abundante em peixes. A alegria do recém-chegado, por mais que os vendedores teimassem em permanecer amuados, era contagiante!... Logo eles também estavam se desfazendo em sorrisos para as crianças, e o dia que prometia ser um tédio transcorreu prazerosamente. Mas, apesar da satisfação inesperada, havia algo que intrigava os vendedores: se não havia bolsos nas fantasias, de onde o estranho sujeito retirava os coelhinhos de feltro que ele distribuía a todas as crianças que entravam na loja?!... E os coelhinhos chamaram tanto a atenção das crianças que até mesmo aquelas que não possuíam dinheiro para comprar os ovinhos acabaram se aproximando. E os funcionários se surpreenderam ao verificar que as crianças menos afortunadas não saíam de mãos vazias: além de ganharem o coelhinho de feltro, ainda recebiam gratuitamente um ovinho de chocolate.

Quando Felipe retornou de seu merecido descanso, a Páscoa já havia passado, e ele ficou surpreso quando ouviu um de seus funcionários dizer: “Essa foi a melhor Páscoa que já tivemos!!!.... O senhor ficará muito satisfeito com os lucros, e nós gostaríamos de pedir-lhe que contratasse o Lelo para ser nosso gerente. Nós ficamos muito decepcionados porque pensávamos que ele continuaria conosco, e ele não retornou depois da Páscoa.”

Profundamente intrigado, Felipe disse: “Eu não sei a quem vocês se referem. A loja estava entregue em suas mãos, e eu não contratei mais ninguém.” Com a fisionomia iluminada por um sorriso, ele acrescentou: “Os números realmente superaram as expectativas!!!...  Considerem-se meus sócios a partir deste momento. Embora vocês não possuam capital, têm qualidades que dinheiro algum poderia substituir.”

Os funcionários entreolharam-se surpresos e emocionados. Foi apenas depois de alguns minutos que um deles conseguiu recobrar a voz para dizer: “Obrigado.”